quinta-feira, 11 de março de 2010

Clandestinidades em jeito de conto

Aquela música, naquela manhã, àquela hora, enquanto se dirigia para a Estação, foi como que um sinal.
E logo com ela, que na sua visão "pluma" da vida, achava um quê de mágico -e até de realidade- nesses "sinais". Em jeito de conspiração do Destino ela valorizava a ocorrência (coincidência?) de certos factos em determinados momentos e lugares, embora sempre negasse os fenómenos transcendentes. Costumava rir-se desta sua faceta adolescente e desdenhava até de quem se dedicava a seguir os ditos sinais. Mas a verdade é que titubeava sempre que isso acontecia consigo.
A música (e logo aquela!) era, pois, um sinal sussurrando que devia ligar-lhe e dizer: "hoje vou aí!". Mas hesitou.
Sempre segura de si e dos outros estava convencida de que o seu silêncio, imperador e dono dos tempos últimos, não seria quebrado. Como podia ele estar tanto tempo sem saber de si?....
O Sol também era um sinal.
Rasgando os tímidos mas, não obstante, insistentes farrapos de nuvens, impunha-se na luz e no calor. Era uma figura da força da Natureza e, seguindo-lhe os passos, ou melhor, os raios, encorajou-se e mandou-lhe uma sms. De teor formal, franco e seco deu-lhe conta de que dentro de uma hora estaria perto dele. Exultou quando teve resposta! Igualmente formal, franca e seca: “Vou ter contigo”.
Desse segundo em diante foi arrebatada pela ansiedade.
Queria dizer-lhe, olhos nos olhos, um ensaiado Adeus, dizer-lhe o quanto ele não merecia as emoções que lhe dedicava, arremessar-lhe umas quantas frases cliché tão apropriadas a discussões onde as vontades se querem intrépidas. Ou então... enternecer-se quando os seus olhos encontrassem os dele, entregar-se à languidez característica de quando se mata saudades...
E o tempo não passava, a distância não encurtava.Volvidos minutos que pareceram horas e horas que pareceram dias, chegou ao destino. O local de encontro, entretanto acertado por outras mensagens sempre formais, francas e secas, era descaracterizado, movimentado, atribulado pelo vai-e-vem de pessoas vestidas de anonimato. Um cenário nu da carga emotiva que o momento reclamava.
Num rápido olhar, não o encontrou. Desta vez decide ligar-lhe (às malvas com as mensagens!!).
Concurvada sobre o telefone, qual espia na mais secreta missão e na inglória tentativa de filtrar os sons da cidade e das gentes a fim de ouvir quem do outro lado da linha queria falar, apercebe-se de um vulto ao seu lado... dos pés sobe o olhar e eis que encontra o olhar desejado e o sorriso arisco...
Enterneceu-se... e, assim desarmada, devolveu-se a ele e sorriu-lhe (há rendições que, de tão prazerosas, têm um custo que só o Tempo é legítimo cobrador...)

2 comentários:

  1. Piu, sei que posso ser uma chata (muito raramente, claro...) quando tento retirar o acréscimo literário que colocas nas mais singelas situações da vida, mas há algo que tenho de dizer-te porque MERECES!!tens uma capacidade EXTRAORDINÁRIA de escrita! que passa por ter uma visão profunda dos sentimentos e emoções...por ter um dominio completo da linguagem...por saber fazer a combinação perfeita entre os dois elementos! Não te esqueças - quando fores uma escritora do grande público - que eu SEMPRE acreditei no teu valor literário!És uma pessoa muito valiosa e espero que algo de mágico te encontre...

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  2. Feiticeira diz:

    Querida Amiga... tu nunca és chata! As amizades sólidas, fortes e quase eternas assentam na sinceridade mesmo quando se tem formas diferentes de ver as "singelas situações da vida". A magia está em que, no equilíbrio da vida, talvez eu precise da "objectividade" e tu precises de algumas doses de "lirismo" ... )))


    Obrigada por tudo e sempre... sentir-me-ei sempre rica e afortunada com amigas como tu..

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