sábado, 31 de julho de 2010

!!!!

(estas coisas dos blogs e das redes sociais permitem-nos um registo em espécie de desabafo que, neste momento, me apetece)


Hoje quase perdi uma amizade que muito estimo e quero continuar a estimar . Por força de uma precipitação de tempos, caí num (legítimo) juízo sobre a minha lealdade que de todo não correspondeu à inocente intenção que esteve por detrás da minha atitude.

Apesar de tudo esclarecido (ainda bem!) levei-me a reflectir , uma vez mais, sobre esta coisa da dualidade de perspectivas de uma realidade ou de um facto real. Quantas vezes a objectividade ou simplicidade de um gesto, uma atitude, uma reacção, uma palavra e até um silêncio, não é questionada ou maculada por uma perspectiva de uma “lente” diferente?

Apesar do constrangimento dessas situações e nunca dispensando a inabalável força da honestidade, resta-nos, ainda assim, acreditar que quem nos vê erradamente tem o dever de assumir a possibilidade de poder estar a ver-nos subjectiva e, por consequência, erradamente…

Espero não mais voltar a ser mal-entendida nos meus gestos, atitudes, reações, palavras e silêncios sendo que de tudo farei para clarificar situações dúbias sobretudo quando o que está em causa é a minha intenção e até o sentido dos meus afectos!

(fim de desabafo)

terça-feira, 20 de julho de 2010

Carta ao Vasco...

Meu Querido Vasco:

Ainda não fomos apresentados porque esta tua Tia Postiça está sempre numa vida a mil e é bom que comeces a perceber isso em mim. Eu sou a personificação do stress e da ansiedade como os teus pais um dia terão oportunidade de te contar e as tuas outras tias postiças farão questão em confirmar, fartas que estão de me conhecer (aturar?).

E digo que é bom que comeces por perceber esta minha característica porque é precisamente por ela que eu quero dizer-te: OBRIGADA, meu doce Vasquinho!

Um dia contar-te-ão a tua história com outra ternura, com outro sabor, com outro sentimento de gratidão (a uma qualquer entidade com nome ou sem nome, divindade ou simples acaso, não sei…) mas eu gostaria de te dizer que ela tem um encanto especial para mim: contigo aprendi que a magia da vida reside em aprendermos a nada esperar dela. Os projectos, os planos são meros instrumentos da nossa vã ilusão de que dominamos ou comandamos os acontecimentos.

(sim, meu docinho, os teus pais e as tuas tias também te dirão que esta tua tia é uma romântica incorrigível e, nesse seguimento, tem a mania que sabe escrever e, pior!, tudo é pretexto para “textinhos”, “declarações”, “escritos”, “recadinhos” e agora até um Blog… )

Tantas palavras e ainda não te disse que o início da tua história de Vida é de uma beleza e de uma magia fabulosa!! Um começo em grande, meu docinho…

Num quadro de lutas, de frustrações, de receios, de esperanças quase esvaídas mas prontos para iniciar, (agora sim!!!) uma nova batalha, não olhando a meios mas apenas ao fim supremo da tua existência, os teus pais foram presenteados pela magia da “não espera”. Imagina que te “descobriram” no momento em que a Mamã fazia uma Ecografia como exame inicial de um tratamento de fertilidade!!!!! Delicioso, não é? Meses de espera, de procuras, de esperanças e de desesperanças e desespero eis que tu apareces quando já era difícil acreditar que virias…

Nesta fase da minha vida, Vasquinho, nem imaginas o quanto é importante acreditar que essa tua traquinice transformada em lição de Vida é a essência de uma existência serena, o segredo para um percurso mais leve e menos tenso… Nada esperar significa que tudo o que vier é sempre mais do que o que se tinha.

Enfim, fica pois aqui o desabafo e um pequenino retrato desta tua tia que é um poço de emoções…

Deixo-te um beijinho doce com uma certeza de que o início da tua história só pode ser um prenúncio de coisas boas na tua vida e das quais desejo ser participante ou mera espectadora, mas sempre presente…

Da tua Tia Feitiçeira....

( foi preciso o nascimento de uma criança para quebrar a falta de inspiração para a escrita.. )

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Outro roubo...

Beijo

Um beijo em lábios é que se demora
e tremem no abrir-se a dentes línguas
tão penetrantes quanto línguas podem.
Mais beijo é mais. É boca aberta hiante
para de encher-se ao que se mova nela.
É dentes se apertando delicados.
É língua que na boca se agitando
irá de um corpo inteiro descobrir o gosto
e sobretudo o que se oculta em sombras
e nos recantos em cabelos vive.

É beijo tudo o que de lábios seja
quanto de lábios se deseja.



Jorge de Sena (um português que sorveu a brasilinidade tão deliciosamente exposta neste poema..)

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Eu, Feiticeira, me confesso ladra... mas apenas de textos que me espelham...



(Também)
SOU EU

Sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo,
Espécie de acessório ou sobressalente próprio,
Arredores irregulares da minha emoção sincera,

Sou eu aqui em mim, sou eu.
Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou.
Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma.
Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim.

E, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco inconseqüente,
Como de um sonho formado sobre realidades mistas,
De me ter deixado, a mim, num banco de carro elétrico,

Para ser encontrado pelo acaso de quem se lhe ir sentar em cima.
E, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco longínqua,
Como de um sonho que se quer lembrar na penumbra a que se acorda,
De haver melhor em mim do que eu.


Sim, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco dolorosa,
Como de um acordar sem sonhos para um dia de muitos credores,
De haver falhado tudo como tropeçar no capacho,
De haver embrulhado tudo como a mala sem as escovas,
De haver substituído qualquer coisa a mim algures na vida.


Baste! É a impressão um tanto ou quanto metafísica,
Como o sol pela última vez sobre a janela da casa a abandonar,
De que mais vale ser criança que querer compreender o mundo —
A impressão de pão com manteiga e brinquedos
De um grande sossego sem Jardins de Prosérpina,
De uma boa-vontade para com a vida encostada de testa à janela,
Num ver chover com som lá fora
E não as lágrimas mortas de custar a engolir.

Baste, sim baste! Sou eu mesmo, o trocado,
O emissário sem carta nem credenciais,
O palhaço sem riso, o bobo com o grande fato de outro,
A quem tinem as campainhas da cabeça
Como chocalhos pequenos de uma servidão em cima.

Sou eu mesmo, a charada sincopada
Que ninguém da roda decifra nos serões de província.

Sou eu mesmo, que remédio! ...


As maravilhosas poções de Álvaro de Campos...

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Voltei à fase dos poemas, hinos à sensibilidade...

Nas minhas incursões noturnas pela internet descobri, ontem, este poema do saudoso Eugénio de Andrade.

Tocada, rendida e maravilhada "furteio-o" da sua sede e trouxe-o até ao meu canto... estarei perdoada? ...

"Apenas um corpo

Respira. Um corpo horizontal,
Tangível, respira.
Um corpo nu, divino,
Respira, ondula, infatigável.

Amorosamente toco o que resta dos deuses.
As mãos seguem a inclinação
do peito e tremem,
pesadas de desejo.

Um rio interior aguarda.
Aguarda um relâmpago,
um raio de sol,
outro corpo.

Se encosto o ouvido à sua nudez,
uma música sobe,
ergue-se do sangue,
prolonga outra música.

Um novo corpo nasce,
nasce dessa música que não cessa,
desse bosque rumoroso de luz,
debaixo do meu corpo desvelado."


Fabuloso, não é?... "um novo corpo nasce debaixo do meu corpo desvelado"...

Um sorriso apenas ...